segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

" uma festa para a vida e uma festa ainda maior para a morte!...Ah! tua morte será adorável: quem a vir ficará feliz. Tua morte será o selo da promessa de nosso amor de eras. Vinde! "
AL II:41 - 66

1° de Dezembro de 1947. Morre  em Netherwood de bronquite crônica agravada por pleurisia e degeneração do miocárdio,  Edward Alexander Crowley, mais conhecido como Aleister Crowley. Partiu aos 72 anos de forma tranquila e destemida, como um sopro, movendo as cortinas do pequeno e humilde quarto em que estava hospedado.

A partir daquela data muitas seriam as disputas pelos direitos sobre as obras do Profeta de Thelema, desentendimentos que correriam o mundo, incluindo alguns bem conhecidos personagens brasileiros. Tempos que também que ficaram na história.

Setenta anos se passaram e com eles, o direito a exclusividade sobre os livros da Grande Besta caíram em domínio público. Uma nova etapa então se inicia. Na nossa geração, as contendas não são mais travadas por quem pode ou não traduzir suas obras, mas sobre quem faz melhor!

O LIVRO DA LEI é um livro escrito por Aleister Crowley, publicado pela editora Chave no ano de 2017, com 207 páginas divididas em 7 partes.

Antes de mais nada é preciso que o leitor interessado nesta obra saiba que esta é uma edição histórica, a primeira a ser publicada no período de domínio público dos escritos de Aleister Crowley. Publicações anteriores a esta - salvo aquelas autorizadas ou lançadas oficialmente pela O.T.O, detentora dos direitos autorais até então - são ilegais. Portanto, esta publicação é marca de uma divisão de tempos dos libri de Thelema no Brasil.

Feito em capa dura, roxa com grafismos cor de abóbora, foge ao padrão comum produzido em vermelho. Não poderíamos deixar de destacar o fator estético, que de fato, foi pensado com bom gosto. Para além disso, ressaltamos que esta não é uma publicação de objetivo estritamente religioso, mas vem acompanhada de alguns outros elementos, textos, que precedem e sucedem o Liber AL vel Legis em seu miolo.

Em seu prefácio, escrito por M.B., destaca a grande importância que Crowley teve dentro e fora do Ocultismo, servindo de influência para intelectuais dos mais variados gêneros, e ainda para a cultura pop, com seus quadrinhos, bandas, filmes, clipes, músicas e todo um universo de elementos que fazem referência direta e indireta a ele. Sem dúvidas, uma ótima fonte para pesquisas.

Na Introdução a Edição Brasileira, assinada por Marina Della Valle, a tradutora do livro, nos traz um ótimo resumo da biografia de Aleister, complementado pela história do recebimento do Livro da Lei,  seguido por suas explicações sobre os desafios de traduzi-lo. Segundo nos diz


O Livro da Lei é um texto cheio de particularidades. Há inconsistência de grafias, como o nome da deusa Nuit, que aparece também como Nuith; o fraseado muitas vezes é incomum e dá margem a obscuridades; há mudanças bruscas de "tu" para "vós" e vice-versa; há também o uso de "vós" quando o narrador obviamente se dirige a uma só pessoa; o uso de maiúsculas não segue as regras comuns do idioma original e há mesmo uma palavra que não existe no inglês, questões diligentemente mencionadas por Crowley em seu comentário sobre o livro...
pg. 22 


Esta edição respeita a exigência de que as traduções devam sempre vir acompanhadas do original, e a diagramação fez um ótimo trabalho em colocar - uma em cada página -  versão em inglês ladeada pela tradução em português.

Não entraremos aqui no mérito de questionar as convicções religio-filosóficas da tradutora para ter sido incumbida desta função, já que há uma prescrição encontrada nos libri de Thelema para que traduções do Livro da Lei sejam feitas apenas por thelemitas graduados, entretanto, e levando em consideração o comentário da autora destacado acima, e onde à continuidade do capítulo a mesma deixa claro ter ciência sobre elementos gemátricos que compõem a produção original deste livro, não podemos deixar de citar o incômodo que por vezes sentimos ao ler sua versão. Exemplificaremos :


I:7.Behold! it is revealed by Aiwass the minister of Hoor-paar-kraat.

I:7. Contemplai! [*] é revelado por Aiwass o ministro de Hoor-paar-kraat.
*O pronome ' it / isto ' foi eliminado.

I:9. Worship then the Khabs, and behold my light shed over you!

I:9. Adorai então [*] Khabs, e contemplai minha luz derramada sobre vós!
* O artigo ' the / o ' foi eliminado.


[ o destaque em negrito foi usado por nós apenas para uma melhor visualização do texto e não constitui sua forma original.]

Nos parece que estes dois exemplos sejam suficientes para indicar a razão de nossa fala, entretanto, é importante que o leitor tenha em mente que isso ocorre em vários momentos da tradução.

Fato é que a língua portuguesa permite, através de seus vocábulos, indicar artigos e pronomes sem a necessidade de tê-los ali, de forma aparente. Todavia, esta é uma possibilidade e não uma obrigatoriedade, ou seja, não entendemos como necessária a eliminação destes nesta tradução, especialmente por sua natureza de caráter profundamente esotérico, onde " pingos podem sim ser lidos como letras. "

Obviamente que não estamos considerando que seja possível uma correspondência perfeita em traduções quando o assunto é gematria, - em termos gemátricos é imprescindível a análise do texto em sua língua original - porém, pensamos que num livro desta natureza, mesmo na tradução, manter é melhor que eliminar. Respeitamos a escolha e bagagem acadêmica da tradutora mas não podemos nos furtar de deixar registrada esta opinião.

O livro vem ainda acompanhado d'O Comento, os originais escritos pela Besta, e Os Comentários de Crowley, onde fala longamente sobre o recebimento do AL e as condições em que se encontrava, sua rejeição inicial para com o mesmo e dúvidas sobre sua natureza, análises sobre determinadas passagens, dentre outros.

Por fim, David Soares nos apresenta um capítulo onde trata do encontro de Aleister com Fernando Pessoa, e o possível contra gosto deste em encontrar o mesmo. Levanta questões sobre os reais interesses de Crowley para este encontro e destaca também o famoso evento arquitetado pelos dois onde o Mago fingira sua morte na Boca do Inferno. Fechamos o livro com o poema de Crowley intitulado Hino a Pã, em sua versão original e traduzido por Pessoa para a língua portuguesa.

Pensamos que a introdução desta resenha fale per se. Ter esse livro é uma oportunidade única de participar de um momento histórico, o resto é detalhe.


por Allan Trindade



post scriptum: e para aqueles que estejam curiosos para saber qual fora a tradução dada para a máxima "Do what thou wilt shall be the whole of the Law", a forma usada aqui é "Faze o que tu queres há de ser o todo da Lei."


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2 comentários:

  1. Muito bom. Sem dúvida foi um grande pesquisador e magista. Mas eu sinto que o legado de Crowley, esteja sendo visto de uma forma muito rasa. Pelo menos a nível Internet, os ditos "seguidores" de Crowley, são uma mescla de arrogância, ignorância e até mesmo demonstram ser pessoas psicologicamente bem esquisitas,tomando a magia de Crowley pelo seu lado mais obscuro, sem saber direito no que isso pode acarretar para suas vidas. Creio que o "faça o que tu queres", não é simplesmente viver em uma penumbra espiritual e psicológica.

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  2. No mínimo intrigante!
    Avulsa o leitor a querer mergulhar nesse mundo de Aleis ter..

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