quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Salvo as aspirações da classe dos feiticeiros, que costumam ter objetivos extremamente pontuais dentro da prática mágica, não se importando com nenhum aspecto transcendental além da conquista específica de algum intento, magos e místicos diferem destes primeiros justamente por agregarem em seu Caminho a busca pelo auto conhecimento.

São várias as referências dentro do Esoterismo e do Exoterismo ocidental sobre a importância e os benefícios desta busca, sendo a mais famosa delas aquela encontrada no pórtico do Oráculo de Delfos, onde se lia: conhece-te a ti mesmo.

Conhecer a si mesmo pode ser um desafio diário de auto descoberta envolvendo desde as reflexões mais complexas e filosóficas da natureza do ser, até as atitudes mais simples, como o porque de seus gostos e certezas e a preferência por um livro ou prato específico, por exemplo.

Somos seres dinâmicos e mutáveis, não apenas pela nossa própria natureza e fisiologia, mas também e em muitos casos, principalmente pela influência do espaço que nos rodeia. Corpo, mente e espírito vivem em constante movimento até mesmo quando não temos a menor noção disso. Então como avaliar se as convicções que temos hoje são as mesmas que tivemos ontem e serão as mesmas que teremos amanhã? 


UMA PERGUNTA POR DIA é um livro publicado pela editora Intrínsica, no ano de 2015 com 366 páginas.


Qual a primeira coisa que você faz ao acordar? Qual a última coisa que você faz antes de dormir? Você tem algum ritual específico para estes momentos? Quanto tempo você dedica para pensar sobre si? Talvez seu dia a dia não te permita manter nenhum tipo de hábito que ocupe mais que um minuto para pensar sobre isso. Pois bem, este livro serve exatamente para você. 

Sua proposta é extremamente simples e por isso mesmo igualmente atraente. Um diário, com um espaço de cerca de três linhas para cada questão, contendo uma pergunta diferente para cada dia do ano, com espaço para o registro de cinco anos. 365 perguntas e 1825 respostas sobre si mesmo é o que você terá por fim. Sua função será então responder as mesmas perguntas, todo ano, durante meia década de auto observação. Por exemplo: no dia 28 de dezembro encontramos a questão Você prefere aconchego em casa ou sair para se divertir?. Se começar respondendo no ano de 2017, terá de fazer o mesmo no ano de 2018, 2019 e assim sucessivamente, até completar cinco anos. Interessante, não?

As perguntas variam desde aquelas mais complexas como Qual a sua missão? até aquelas menos importantes para muitos como O quê desperta seu lado geek?. Isso, a ideia aqui não é tornar este hábito um exercício cansativo de reflexão, mas te dar a chance de ao menos pensar por um minuto sobre aquilo que você deseja, aquilo que te aconteceu, aquilo que você gosta, aquilo que você não quer mais, aquilo que você acha, etc. Capa dura, folhas com bordas douradas, fitilho para marcar os dias, compacto. Definitivamente um mimo para si mesmo ou para dar de presente.

Resolvemos trazer este título aqui, assim mesmo, com essa linguagem informal, pois pensamos que mesmo nós, que vislumbramos objetivos maiores para nossa vida material e espiritual, que buscamos o equilíbrio entre aquilo que somos e aquilo que aspiramos, podemos adaptar os ensinamentos maiores a realidade do mundo moderno. E deixamos claro que não estamos falando de substituições. Não queremos com isso dizer que este tipo de diário pode substituir  o caráter científico e a importância de um Diário Mágico. De forma alguma! Entretanto, este pode ser um ótimo exercício para aqueles que ainda não iniciaram os registros sobre si, ou mesmo para aqueles que mesmo tendo suas anotações sobre suas experiências mágicas, tenham uma alternativa mais prática, objetiva, diária e descontraída para tudo isso. 


O desafio de conhecer o universo particular começa a partir da coragem de encarar a si mesmo de forma desprendida e não dogmática. A síndrome da imutabilidade - também conhecida como síndrome de Gabriela - pode ser o pior de todos os pecados para o adepto. O ser humano que não se lança a novas experiências e que não muda, é um ser um humano que não vive, que já está 'morto'. O ser humano que vive mas acha que não muda, ou é covarde ou está simplesmente louco.

Permita-se conhecer-se na Vossa Majestade e na sua simplicidade.


por Allan Trindade


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domingo, 24 de dezembro de 2017

Na resenha anterior falamos sobre as dúvidas comuns que os principiantes podem ter em relação a quais autores ou títulos primeiro consultar. Que a vanguarda do Esoterismo moderno, oriunda em grande parte dos séculos XIX e XX, e com uma linguagem por demais técnica ou rebuscada em alguns casos, pode não dar condições para o novato compreender todas as nuances e profundidade que os textos apresentam. 

Não pensamos ser exagero dizer que o Ocultismo seja um caminho de muito, muito mais estudo que prática. O próprio Mvtvs Liber, um dos grandes clássicos da Nossa Tradição, nos traz o axioma lege, lege, lege, relege, labora et invenies. É preciso ler, ler, ler, reler para então trabalhar. Não discordamos desta máxima, entretanto, ousamos dizer que a prática unida ao estudo pode ser igualmente proveitosa.

Muitos são aqueles que não conseguem viver tanto tempo saciando apenas os anseios do intelecto e precisam de mostras físicas de que tudo isso, todos estes textos, ideias, filosofias e sistemas não são um simples amontoado verborrágico inventado por um bando de intelectuais desocupados que, por não terem acesso a internet em sua época, viviam viajando no Plano Astral. A experiência pode, em muitos casos, preceder o estudo.

Portanto, se você ainda não leu o suficiente mas já tem dúvidas sobre o que praticar, quem sabe este livro possa te ajudar.



THE ONE YEAR MANUAL é um livro escrito por Israel Regardie, publicado pela Samuel Weiser, INC. no ano de 1992, com 71 páginas.


Sim, este é um livro curto, com poucas dezenas de páginas, mas não se deixe iludir pelo seu tamanho. Sua proposta é nada menos que objetiva e seu título e subtítulo deixam claro a que ele veio: ser um manual com duração mínima de um ano, voltado para guiar o iniciante nos caminhos místicos do esoterismo ocidental.

Aqui você não precisará de conhecimento prévio nenhum. Cada capítulo é planejado para ser praticado por pelo menos um mês, e contém explicações sobre os benefícios que tais práticas podem vir a causar no aspirante, sempre com foco no maior autoconhecimento corporal e equilíbrio espiritual. Se você conhece o mínimo de yoga, dos exercícios mágicos oriundos da Ordem Hermética da Aurora Dourada ou ainda da A.'. A.'., você poderá prever o conteúdo que este título traz, uma vez que alguns dos rituais apresentados aqui sejam adaptações daqueles de lá. 

Não espere por exigências de grandes aparatos ritualísticos, nem mesmo por explicações muito aprofundadas sobre o funcionamento metafísico de cada um dos exercícios expostos. Todo o conjunto foi pensado com foco na prática e no iniciante, que disponha ao menos de um pequeno espaço reservado para meditar, como um quarto com uma cama e uma cadeira, por exemplo, e esteja disposto a dispensar pelo menos quinze minutos diários para a busca de sua iluminação

Nesta edição, Israel salienta que fez algumas modificações, como chamar o livro de Manual do Ano ao invés de Doze Passos Para a Iluminação Espiritual - que aqui tornou-se o subtítulo - por ter considerado presunçoso demais este nome da primeira edição. Além de modificações dos textos dos próprios rituais que, segundo ele, na edição anterior, estavam com citações cristãs em excesso.

Vale destacar que na nossa opinião os textos continuam com muitas referências cristãs e poderiam estar bem mais neutralizados, de modo a atender um público mais abrangente, e que talvez não se sinta tão a vontade com adaptações disfarçadas de forma mais ou menos subliminar a Jesus e seu contexto. Em verdade, e para sermos justos, diremos o mesmo para o primeiro exercício, das Quatro Adorações solares, desenvolvido para ser executado durante as grandes horas do dia e da noite, e que traz orações para os deuses keméticos. Somos da opinião que referências a deuses de qualquer religião deveriam ser evitadas pois trazem consigo uma carga energética - ou de pensamento - que talvez não esteja em consonância com o período atual do iniciante. Quem sabe aqui o novato perceba que a magia é também considerada uma Arte pois nela, vez por outra, temos de mostrar o nosso talento e habilidade em adaptar e produzir nossa própria Obra.

Para além do exercício previamente citado, o livro nos traz ainda Body Awareness, Relaxation, Rhythmic Breathing, Mind Awareness, Concentration - Use of the Mantram, Developing the Will, The Rose Cross Ritual, The Middle Pillar Ritual, Symbol of Devotion, Practice of the Presence of God, Unity - All is God e Invoke Often! Inflame Thyself With Prayer.

Israel Regardie dispensa comentários pois é figura conhecida e consagrada em nosso meio - por sua experiência e dedicação de toda uma vida ao Ocultismo - e novamente  nos abrilhanta com mais uma obra digna de nota. Está voltada especificamente para aqueles que pouco ou nenhuma experiência prática possuem neste meio mas que querem, sem se prender a nenhum caminho específico, ter algum tipo de treinamento espiritual. 

A força da magia é intrínseca a natureza e não depende de conhecimento técnico para se manifestar. O que falta a maioria de nós então é compreender que somos parte desta mesma natureza, portanto e por consequência, seres potencialmente mágicos. Tomar consciência do próprio corpo e mantê-lo em equilíbrio é santificar o Templo no qual o seu espírito reside. Ler pode te fazer acordar para isso. Mas apenas o praticar te fará sentir esta Verdade.

por Allan Trindade




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segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Ao decidir se enveredar pelos caminhos do Ocultismo e do Esoterismo é absolutamente natural que você tenha dúvidas sobre quais temas ou autores primeiro estudar. Com uma variedade de opções grande o suficiente para deixar até o mais habilidoso dos 'multitarefas' confuso, dar os primeiros passos pode fazê-lo se sentir tão desemparado quanto um bebê que ainda ensaia sua saída da fase do engatinhar e se apoia, sem muita confiança, naquilo que está mais próximo. 

Ao consultar indivíduos que estão a mais tempo nesta senda, é bastante comum que estes lhe recomendem os nomes clássicos da literatura oculta, como Lévi, Mathers, Crowley, Blavatsky, Papus...dentre outros. Não podemos negar a importância de conhecê-los, nós mesmos começamos assim, e por isso também podemos afirmar que este início pode ser um tanto frustrante. E a razão para isso se dá por um motivo muito simples: eles não falavam para iniciantes! Não se espante se ao ler o Dogma e Ritual de Alta Magia, a Coletânea Hermética ou ainda a Kabbalah Revelada você não entender praticamente nada.  

Evitar os clássicos não é uma opção para o ocultista realmente empenhado na busca pelo conhecimento, entretanto, pode ser que no princípio, livros mais modernos, com uma linguagem menos complexa, possam te dar um suporte maior para encará-los doravante.

ONDE VIVEM OS DEMÔNIOS? é um livro escrito por Frater U.'. D.'. publicado pela Madras editora no ano de 2011, com 135 páginas.

Ralph Tegtmeier é uma figura relativamente conhecida no contexto ocultista moderno, especialmente nos meios thelêmicos e da Magia do Caos, graças também ao sucesso de um outro livro de sua autoria chamado Practical Sigil Magic (até a presente data, sem tradução oficial no Brasil). Entretanto, não bastasse o uso de seu moto como Frater Ubique Daemon/Ubique Deus para assinar grande parte de seus livros, aqui incorpora ainda uma outra persona, seu alter ego Tia Klara, uma bruxa velha que dentre outras atividades, gosta de suprir seu vício de beber café encontrando-se com outras senhoras, e responder perguntas de curiosos sobre religião e ocultismo nas horas vagas, enquanto fuma seus incontáveis cigarros. 

O livro, surgido a partir da coluna "Templo do Consolo da Tia Klara", presente na revista ocultista alemã Anúbis, é uma reunião das diversas perguntas enviadas por seus leitores, agrupadas aqui de forma objetiva e descontraída, mas nem por isso menos profunda, que atenderão aos anseios tanto de iniciantes, quanto de estudantes médios e avançados, partindo de temas simples como os de Sociedades Secretas, suas verdades e mentiras, até elementos mais complexos como a discussão espaço-tempo e a atuação da magia dentro deste contexto. 

Precedidas por uma pequena nota preliminar, seu título Onde Vivem os Demônios? é apenas uma de um total de 28 perguntas respondidas por esta feiticeira através da mente e criatividade de Frater U.'. D.'. :

Eu preciso de um mestre ou mentor?
Devo entrar para uma ordem magística?
A magia tem que ser sempre ritualística?
O que você acha de Franz Bardon?
A bruxaria é uma antiga religião europeia de culto à natureza?
A O.T.O "inventou" a Magia Sexual?
...


...dentre outras, que já podem dar uma noção ao leitor interessado sobre o conteúdo apresentado.

Ao terminar a leitura deste título, e admirados com o vasto conhecimento de Tia Klara, pensamos que adoraríamos recebê-la em terras tupinikins. Pois se temos o melhor café do mundo, o tabaco é produto nacional, a magia aqui tem nome de macumba, e não demora muito, em uma encruza ou outra você sempre encontra um despacho, então temos tudo que ela gosta! Por isso não temos dúvidas de que no Brasil ela se sentiria em casa. Quem sabe um dia...

por Allan Trindade

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sexta-feira, 8 de dezembro de 2017


" Na manhã de 14 de janeiro de 1907, um homem vestindo um manto vermelho, considerado um irresponsável, apareceu em Kingston alertando as pessoas sobre o fato de que antes do anoitecer a cidade seria destruída. Às três horas da tarde, Kingston, e na verdade toda a ilha, foi atingida por um terremoto de grande magnitude, que não apenas deixou uma vasta área da capital em ruínas, mas matou pelo menos 2.000 pessoas. "

VODU é um livro escrito por Joseph Williams, publicado pela Madras editora no ano de 2004, com 163 páginas divididas em 7 capítulos.

É comum ouvir as pessoas falarem que não se deve comprar um livro pela capa. E as razões para isso possuem lógica tanto para o aspecto positivo quanto para o negativo. Encantar-se por uma bela estampa pode levá-lo a se decepcionar com um péssimo conteúdo. Assim como uma arte não tão atraente pode fazê-lo perder a oportunidade de ler um ótimo texto. Se podemos dizer que contra estes fatos não há argumentos, deveríamos estender o mesmo conceito para os títulos. 

Já fazia algum tempo, estávamos a procura de um exemplar que pudesse servir como uma introdução a este tema tão popularmente conhecido, e lotado de histórias (ou estórias) acerca das práticas e poderes do Vodu. Ora referido como religião, e outras tantas como ofício de feitiçaria, não deve haver uma só pessoa vivendo nas grandes cidades que nunca tenha ouvido falar nesta palavra.

O subtítulo nos tentou de forma igual: Fenômenos Psíquicos da Jamaica. Aparentemente uma combinação consistente o suficiente para suprir a nossa necessidade, e por que não dizer, também a nossa curiosidade. Mas infelizmente erramos. Isso porque apesar do título em português sugerir que este livro trata do assunto que gostaríamos que ele tratasse, seu título em inglês é muito mais justo, e provavelmente não nos conduziria de forma tão tentadora ao erro. Seu nome original, que aqui fora transformado em subtítulo, expressa bem a proposta dessa publicação. Ele não se propõe a tratar do tipo de religiosidade ou magia conhecida como vodu, mas trás a investigação do autor, que vivera por cerca de 6 anos na Jamaica, acerca dos possíveis fenômenos espirituais existentes por lá, e apresenta este trabalho como uma investigação das experiências que tivera e dos relatos daquilo que ouvira.

Em sua primeira parte, e a única que nos parece realmente interessante, elenca uma série de casos de poltergeists, ataques a jovens, batidas em cômodos de casas, apedrejamento de pessoas com pedras que surgem do meio do mato mas que não causam danos físicos as vítimas, possessões, exorcismos, etc... e demonstra que apesar do tempo em que fora escrito, no início do século XX, Williams não se deixara levar pelo apelo popular e sempre mantivera uma postura cética para todos os casos, procurando investigá-los ou se abstendo de tomar conclusões definitivas quando as provas não eram suficientes. 


Os capítulos que se seguem procuram apresentar ao leitor a relação conturbada das tribos africanas existentes naquele país, em especial a dos Ashanti, algumas definições etmológicas, ritos funerários,  suas práticas religio-mágicas conhecidas como Obeah e Mialismo, a forte crença que os pretos mantinham com estes elementos e ainda a relação destes para com os brancos e sua religião, o Cristianismo.

Este é um livro de interesse acadêmico que se ocupa em trazer descrições sobre os povos e crenças da Jamaica do início do século XX. Seu autor faz constantes referências a seu título anterior - Voodos and Obeahs - e aparentemente complementar a esta leitura (na verdade, nossa impressão é que aquele livro precisa ser lido antes deste). Os casos apresentados aqui são repetitivos e se limitam a falar de enterros e pseudo fantasmas que atiram pedras. É um livro para quem tem interesse na história da Jamaica e já detenha algum conhecimento prévio sobre aquele país e seu período como colônia do Reino Unido.

E se você está procurando por instruções sobre como costurar e alfinetar o boneco de vodu do seu inimigo, uma loja de corte e costura pode vir a lhe dar muito mais informações que esse livro, já que afinal de contas, esse tipo de instrução simplesmente não existe aqui.


por Allan Trindade

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segunda-feira, 4 de dezembro de 2017


Há cerca de um ano atrás publicamos pela primeira vez uma resenha falando sobre o Livro de São Cipriano. Nossos canais - blog e youtube - ainda tinham pouquíssimos inscritos e os acessos também não eram tão consideráveis em termos numéricos. Perfeitamente entendível uma vez que o tema ocultismo - tratado como estudo e não como entretenimento - não seja o preferido da maioria da população e que religião costume ser referida por muitos como algo que simplesmente não se discute. Entretanto, ao trazer a público as análises sobre os escritos atribuídos ao famigerado Bruxo Mais Poderoso de Todos os Tempos, vimos um exponencial e inesperado crescimento. Em poucas semanas dezenas de acessos se tornaram centenas, centenas se transformaram em milhares, e hoje já passamos da marca de oitenta mil acessos. Nos surpreendemos.

Nos surpreendemos pois não esperávamos uma aceitação positiva sobre um personagem que mexe tanto com o imaginário e religiosidade popular. Não esperávamos que uma análise crítica, uma resenha, que questiona não apenas a autoria dos livros atribuídos ao Santo Bruxo, como a própria existência de São Cipriano, fosse ser tão bem recebida pela maioria. Desde então, foram várias as mensagens com elogios e agradecimentos pelo trabalho apresentado, as quais só temos, igualmente, a agradecer. Entretanto, muitas também foram as dúvidas, como por exemplo,  sobre como confiar então nos livros existentes atribuídos a figura deste bruxo, ou ainda qual seria o livro verdadeiro, e no que, ou em quais, poderiam acreditar ?

Pensávamos não haver uma pesquisa objetiva que pudesse nos tirar do campo da especulação e que mostrasse se de fato São Cipriano fora real ou não. Pensávamos que não haveria como responder se existem fontes primárias, reunidas por algum pesquisador sério, que atestem ou contestem os textos modernos destes grimórios. Pensávamos que ninguém tinha se dedicado a apresentar ao grande público uma análise comparativa e aprofundada sobre a história e os feitiços do Bruxo mais popular do Brasil e de Portugal. Pensávamos, mas para nossa grata surpresa, estávamos enganados.

THESAURUS MAGICUS II é um livro escrito por Humberto Maggi, publicado pelo Clube de Autores no ano de 2016, com 625 páginas divididas em 10 capítulos.

Este título é uma espécie de antologia, ou seja, uma organização de diversos escritos atribuídos a figura de São Cipriano, reunidos aqui com um objetivo duplo: servir ao pesquisador que tenha interesse em analisar diferentes capítulos dos livros do Bruxo, ou ao praticante que tenha dúvidas sobre a completude estrutural de algum ritual ou texto específico.

Em seu prefácio, chamado São Cipriano, o Escrivão do Diabo, Nicholaj de Mattos Frisvold se ocupa em fazer um apanhado geral sobre a história do Feiticeiro, possíveis relações com a Quimbanda e os diversos grimórios atribuídos a ele em cerca de 500 anos de fatos e lendas. Em seguida, Felix Vicente fala sobre a figura do Santo, o surgimento dos livros e sua relação com o autor desta obra, num resumo histórico e impecável que por si só já valeria a leitura. 

Em seguida, Humberto Maggi fala dos primeiros contatos que teve com os livros de Cipriano, sua decepção com o conteúdo dos mesmos, e o reacendimento do interesse por todo este contexto em 2008, graças aos questionamentos de uma amiga. Em toda esta primeira parte do livro, o autor se dedica a explicar as razões para a existência dos diversos grimórios atribuídos ao Santo, além de apresentar exemplos comparativos com outros livros que podem ter influenciado a existência destes  e análises sobre processos inquisitórios nos quais o livro fora citado. 

Sobre sua organização, Maggi nos explica que 


As partes centrais desta edição vem da versão Portuguesa publicada pela Livraria Econômica e das versões Espanholas do Heptameron, Sufurino e das seções originais do livro de Enediel Shaiah. A essas, muitos textos, trechos, capítulos, feitiços, invocações, etc. associados na tradição mágica ao nome de São Cipriano foram adicionados. A intenção é prover o leitor com uma vasta e significativa coleção de materiais diversos diretamente relacionados à Magia Ciprianica.

Eu organizei o material de acordo com o assunto contido em cada texto. Isto significa, ao invés de simplesmente copiar os livros originais por inteiro, eu dividi seus conteúdos em seções separadas. 


Sendo assim, as seções organizadas pelo autor dividem-se em:


A Origem do Livro 
onde apresenta uma seleção de lendas diversas atribuídas ao seu surgimento.

Vita Cypriani 
onde estão incluídos os contos sobre a vida do Bruxo.

A Arte Mágica 
com instruções sobre rituais: locais mais apropriados para executá-los, qualidades essenciais para o êxito nos feitiços e Armas mágicas.

Talismãs e Amuletos 
com funções e como produzir estes objetos.

O Livro dos Espíritos 
apresentando listas de hierarquias celestes, infernais e elementais, além de conceitos filosóficos sobre estes.

As Preces de São Cipriano 
com orações para as horas, santos, doentes, incluindo aqui a Cabra Preta. 

Os Exorcismos 
com orações e rezas dedicadas a esta prática, além de explicações e listas sobre demônios e almas e as razões para Deus permitir sua ação sobre os viventes.

Tesouros Mágicos 
sobre o uso de forquilhas e varinhas e onde reúne as listas de supostos tesouros enterrados em certos locais do contexto ibérico.

Segredos Mágicos 
onde apresenta receitas e fórmulas de feitiços, para os fins mais diversos, contendo a clássica característica existente em praticamente todas as edições destes livros: a forte presença de sacrifícios de animais.


Através desta organização, nos parece claro para o leitor interessado, que esta obra atende aos anseios de todos aqueles que justamente buscam pelo livro original. Aqui, livros de diferentes épocas e origens estão reunidos e organizados num ótimo tomo, separados por capítulos em comum, que facilitarão o estudo e responderão as clássicas perguntas sobre as verdades e as mentiras envolvendo a vida, a morte e os feitos do Bruxo. 

É leitura obrigatória sobre o tema para qualquer um verdadeiramente empenhado em saber sobre os detalhes históricos da criação deste Cipriano tão conhecido em terras latinas, já que desmistifica as crendices populares, apresentando as razões para o argumento de que muitas destas histórias não passam de lendas, e todo conteúdo possível para provar isto, sem entretanto ser um livro apenas teórico. Em sua primeira parte são apresentados os argumentos científicos, em sua segunda parte estão reunidos os textos tradicionais, atendendo tanto ao leigo, interessado apenas na prática, quanto ao pesquisador, inclinado ao conhecimento. Duvidamos que haja trabalho mais completo que este publicado até a presente data.

Este livro, Thesaurus Magicus II, grande no número de páginas e profundo em seu conteúdo, desbanca o senso comum e não deixa dúvidas de que aqui tamanho é documento!

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Repare. É costume ouvir o povo dizer que um bruxo ou bruxa 
muito antigo deixou como legado manuscritos, diários ou manuais contendo diversas receitas sobre suas façanhas e feitiços. Para alguns, tais livros contém inclusive um poder intrínseco e estar em posse deles significa atrair para si sempre o risco de que lhe tragam poderes surpreendentes ou maldições que podem destruir a sua vida e a dos seus. De fato, não podemos desconsiderar todo este tipo de falação, uma vez que existam uma série de pergaminhos e grimórios que chegaram até as nossas mãos graças ao registro de magistas anteriores, contendo muitas das características descritas pelo populacho.


Entretanto, oriundos de uma época onde o analfabetismo era regra, não há de se esperar que tais objetos existam por aí aos montes, que sejam tão numerosos quanto as numerosas vítimas covardemente acusadas, torturadas e queimadas por crime de bruxaria pela Santa Inquisição. Não. Escritos dessa natureza eram raridade em épocas outras. Foram os tempos modernos que popularizaram a educação e garantiram acesso a todos, de forma indiscriminada, ao aprendizado da escrita e da leitura.

Com a chegada de uma nova era para o mundo da espiritualidade, a perseguidora perdeu sua força, a liberdade tomou seu lugar nos novos séculos, a educação se fez democrática e a ciência pode respirar aliviada. Nesta nova geração, muitos dos nossos hábitos e práticas foram repensados. O proibido praticamente já não existia mais, e portanto, era preciso compensar o tempo perdido. Uma nova linhagem de magistas surgiu, preocupados com a investigação genuína do campo espiritual, destinados a eliminar de uma vez por todas as superstições e se livrar definitivamente das amarras das crenças escravistas.

Sendo assim, transcrever suas experiências não é apenas um dever pessoal, mas também científico e político. É graças a isto que as próximas gerações poderão dar continuidade ao trabalho que nós perpetramos - assim como nós bebemos das fontes daqueles que nos antecederam - para que jamais caiamos no limbo da ignorância novamente. O seu Diário é a mais poderosa de todas as suas armas mágicas. Ele é a sua fonte de Luz Inextinguível. Ele contém os ingredientes necessários para sua Transmutação. Ele é a sua garantia para uma Longa Vida.


ALEISTER CROWLEY E A PRÁTICA DO DIÁRIO MÁGICO é um livro escrito por James Wasserman, publicado pela Madras editora no ano de 2009, com 234 páginas.

Este é um livro voltado especialmente para iniciantes e que trata de uma das Armas mais importantes dentro do Arsenal mágico thelêmico. Nele, James Wassermam se ocupou em fazer uma pesquisa sobre os libri aos quais destacam a importância do Diário mágico na vida de um thelemita e sobre a especial atenção que há de ser dada para este tipo de registro, que deve ter por norte sempre o slogan da A.'. A.'.: o método da ciência e o objetivo da religião.


Crowley insistia para que todos os estudantes mantivessem um diário mágico. O diário é um requerimento formal do Colégio Externo da A.'. A.'. (ver Liber CLXXXV, em Equinox IV, 1, Commentaries on the Holy Books) e necessário para a maioria das práticas. 'One Star in Sight', o manifesto da A.'. A.'. publicado pela primeira vez em Magick in Theory and Practice, em sua descrição dos Graus de Ipsissimus a Probacionista, dá numerosos exemplos da relevância do diário mágico em todos os níveis de realização. Crowley acreditava que o diário acompanhava o magista ao longo de toda a sua carreira. Em apoio a essa opinião, poderia ser citada a descrição de Crowley para os Graus de Magus e de Mestre de Templo, presentes em 'One Star in Sight', em que ele menciona tanto os seus diários quanto os de Frater Achad. pg. 25 - 26



Nesta primeira parte,  o autor fala de forma reduzida sobre sua biografia, de Crowley e de Stansfeld Jones,  traz ainda algumas dicas sobre como lidar com seus registros, desde o seu aspecto físico, comparando diários de capa dura com aqueles virtuais, até a importância da honestidade necessária nestas transcrições, que lhe capacitarão a avaliar suas próprias experiências e conclusões daquele tempo, tanto quanto permitirão que seu instrutor faça uma avaliação mais precisa do seu progresso.


O diário pode ser uma ajuda real para a pessoa que seja honesta o bastante para registrar seus verdadeiros pensamentos e sentimentos e corajosa o bastante para revê-los à luz de experiências posteriores, quando suposições iniciais provem estar erradas. ...quando discute a respeito da Memória Mágica em Magick in Theory and Practice, Crowley provê outro excelente argumento para se manter cuidadosamente o Relatório mágico. pg. 34

O grande obstáculo é o fenômeno chamado de esquecimento freudiano; isso quer dizer que, embora um evento desagradável possa ser recordado de modo suficientemente fiel pelo mecanismo do cérebro, somos incapazes de lembrar dele ou o recordamos erroneamente, por ser doloroso. (MTP, p.51)



Em seguida, o livro traz alguns libri de diferentes classes da A.'. A.'. que servem como exemplos práticos de como Crowley mantinha ou avaliava os Diários de seus pupilos. João São João, uma publicação em classe C da Santa Ordem, é o registro de treze dias da tentativa de Mestre Therion para contactar Adonai. Repleto de detalhes sobre seus afazeres mais comuns, como sobre as pessoas que encontrara, estados de saúde e refeições, até sua devoção e ritualística para alcançar a tão desejada Consecução. Este liber é tido como um modelo ideal de relatório e desmistifica muitas das calúnias perpetradas contra Crowley e seu comportamento religioso. 

Os libri que se seguem são Liber CLXV - Um Mestre de Templo, 28 Teoremas de Magia, Liber E vel Exercitiorum, Liber O vel Manus et Sagittae e alguns extratos retirados de publicações diversas.


Este não é um título indispensável, mas serve bem para aqueles iniciantes nos caminhos mágicos interessados especificamente em Thelema. A participação de James é simples e representa a menor parte desta publicação: 'metade' dela é voltada para lhe dar noção da importância do Diário, com trechos selecionados de diversos libri thelêmicos e comentados por ele. Não fosse pela inclusão destes, talvez o livro não tivesse páginas suficientes para ser chamado de livro. Para iniciantes é um ponto de partida, para intermediários ou avançados, não vale tanto o investimento.

Mas independentemente de sua sua escolha sobre esta aquisição ou não, é preciso que se lembre daquilo que é mais importante por fim: apenas o registro do conhecimento nos fez, nos faz e nos fará evoluir.


por Allan Trindade


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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Uma vez a cada semana a cena se repetia: com certa dificuldade, me espremia e esquivava das pessoas dentro do metrô lotado, lutando para conseguir sair intacto com minhas telas e molduras, evitando os olhares contrariados dos egoístas que por certo achavam um absurdo eu estar ali com qualquer coisa que não fosse uma mochila ou bolsa pequena e, de preferência, amassável. Na verdade, penso que a maioria das pessoas desejavam que ninguém mais estivesse ali, fosse na situação que fosse. 

Para mim era um prazer poder estudar no Centro de Artes Calouste Gulbenkian e, apesar da rotina no caminho, sempre fiz questão de olhar as coisas ao meu redor como se fosse a primeira vez. Os camelôs com suas barraquinhas de doces, o jornaleiro, o prédio em construção, a Sapucaí - tão aparentemente menor quando está vazia e não é Carnaval - e o viaduto com um cruzamento de carros e sinais tão confusos, que o melhor seria que eu fosse um avatar de Skanda para conseguir olhar em tantas direções ao mesmo tempo. E fora justamente nele que algo diferente ocorrera desta vez. Lá estava, colado bem no alto de sua lateral, um cartaz onde em letras garrafais se lia:


HALLOWEEN É SATANISMO. BRASIL, PAÍS CRISTÃO! 


O movimento que produzira o mesmo, do topo de sua má fé, ou ignorância, sublinhou as palavras Halloween e Satanismo com as cores azul e vermelha - quem sabe de modo a induzir subliminarmente uma referência aos Estados Unidos -, enquanto que Brasil e cristão traziam as cores verde e amarela abaixo. 

Talvez eles não soubessem que o Brasil não é cristão, mas é constitucionalmente um país laico. Talvez eles não soubessem que os EUA não são a origem do Halloween. Talvez eles não soubessem que mesmo a Inglaterra não representa a totalidade da fonte desta celebração. Talvez eles devessem pensar que um país tão mestiço e sincrético quanto o nosso, devesse celebrar o entendimento e a pluralidade cultural. Talvez eles devessem estudar um pouco mais antes de colar asneiras por aí...talvez, só talvez.


A ÁRVORE DO HALLOWEEN é um livro escrito por Ray Bradbury, publicado pela editora Bertrand Brasil no ano de 2014, com 155 páginas divididas em 20 capítulos.

Era Halloween. A noite mais esperada por aquele grupo de nove meninos que consideravam esta a data mais especial de todo o ano. Vestidos com suas fantasias de monstros, fantasmas e caveiras, estavam mais uma vez reunidos para sair pelas ruas de sua pequena cidade e bater de porta em porta em busca de suas recompensas. Sim, todos prontos, porém faltava um deles. O mais arteiro e generoso de todos simplesmente não aparecera até aquele momento. O que teria lhe acontecido?

Preocupados com a ausência de seu amigo mais especial, os oito meninos vão em direção a casa de Pipkin e lá o encontram, um tanto estranho, sem todo aquele vigor contagiante a qual todos estavam acostumados a ver em sua face, desta vez pálida e esquisita. Sem querer dar detalhes sobre suas condições de saúde, o jovem pede apenas que seus amigos iniciem a caçada por doces sem ele, pois os encontrará em seguida. Nos limites da cidade, o grupo de fantasiados chega ao local mais assustador de todo o perímetro: uma ravina repleta de cogumelos, animais estranhos e noturnos. O destemido Skelton, vestido com sua roupa de esqueleto, vai na frente, cruza o local, e guia seus companheiros em direção a casa mais esquisita de toda a cidade, repleta de chaminés e janelas assustadoras, portões e aldrabas com faces humanas, e uma árvore gigante e horripilante, lotada de abóboras sorridentes e macabras. 

O que encontram por lá? 
Gostosuras ou travessuras? 
E por que não gostosuras & travessuras?!

A trama, cheia de magia e situações inusitadas, descreve as traquinagens dos garotos em suas viagens pelos continentes, no tempo e na história, para descobrir as possíveis origens de sua festa mais querida, acompanhada da doçura de valores como doação e amor, em nome da amizade. Egípcios e alemães, gregos e romanos, celtas e franceses, ingleses e mexicanos, estão todos aqui, dando sua contribuição para esta data tão especial.

O livro de Bradbury é uma daquelas histórias infanto-juvenis que nos cativam desde o enredo até a forma de sua escrita, simples e fácil de ser acompanhada. As ilustrações feitas por Joseph Mugnaini são um mimo a parte, e apesar de focadas no tema principal da história - mortos, bruxas, morcegos, cemitérios e fantasmas, assustadores para a maioria das pessoas - tem o mesmo tom singelo que Ray traz em sua narrativa. 

Ao ler certas sinopses ou resenhas por aí, é provável que você se depare com a afirmação de que este livro se propõe a explicar de forma romanceada as origens do Halloween. Isto é em partes verdade, mas não de todo. De modo a evitar dar spoilers, vamos nos ater a dizer que este livro não tem grandes pretensões históricas, de de fato explicar as origens desta celebração através de um viés acadêmico ilustrado por uma história para crianças e adolescentes. Não. Entretanto, o livro traz de forma simples, referências filosóficas sobre as possíveis relações existentes entre a origem da comemoração do Dia de Finados em diferentes culturas ocidentais, o conceito do mito solar e em especial, sobre como lidar com a morte.

Este é um título indicado para todas as idades, para aqueles interessados no tema religião, e até mesmo, na temática esotérica. 

E apesar do contragosto de alguns, acho que desta vez seria ótimo encontrar, em um viaduto qualquer, não um cartaz demonizando uma festa pagã, seja ela qual for, mas um pôster anunciando a exibição nos teatros de A Árvore do Halloween. Afinal de contas, arte e conhecimento nunca são demais, mas ignorância é.


por Allan Trindade


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domingo, 8 de outubro de 2017


A Maçonaria, reconhecidamente uma das Ordens mais antigas ainda em atividade nos tempos modernos, tem um longo histórico de influência no mundo ocidental. Responsável pela formação de países,  influenciadora de ideais libertários e ações revolucionárias, carrega em seu peito o orgulho de ser amada por seus membros, e em suas costas o peso de ser odiada por seus perseguidores.

Costumeiramente associada de forma autômata ao conceito de sociedade secreta, tem se apresentado ao vulgo como uma Ordem discreta, uma vez que o mundo tenha plena ciência de sua existência, e que não mais faça uso do silêncio para garantir sua sobrevivência.

Em seu contexto medieval, fora centro de formação para os construtores que, através de mãos extremamente habilidosas e espírito devocional,  edificaram prédios grandiosos e imponentes catedrais, em muitos casos, ocultando entre suas colunas os símbolos e mensagens esotéricas, responsáveis pela perpetuação do conhecimento velado adquirido em algum momento misterioso de sua história.

Entretanto, o passar dos anos e as mudanças naturais aos quais todos estamos submetidos parece ter afastado muitos de seus membros modernos à busca por todos aqueles elementos e registros fantásticos que, mesmo quando encenados através de seus rituais de iniciação, parecem não convencer grande parte de seus aprendizes.

Os tempos passam e as coisas mudam. Nos dias de hoje, muitos são os maçons que encontram em suas Lojas um espaço para confraternizar com seus iguais, e dedicar parte de sua obra e investimento a caridade, usando como ferramenta a filantropia, com o objetivo único de construir um mundo melhor. Para muitos, esta é a função que lhes cabe e lhes basta. Mas existem aqueles que não satisfeitos com o cenário atual, querem escavar fundo e descobrir os poderes invisíveis que, mesmo após tantos séculos de calúnias e intempéries, ainda fazem com que tudo permaneça justo e perfeito.

A CHAVE DE SALOMÃO é um livro escrito por Lon Milo DuQuette, publicado no Brasil pela editora Pesamento no ano de 2009, com 159 páginas, divididas em duas partes.

DuQuette ocupa-se inicialmente em relatar ao leitor sua relação com a Maçonaria e descrever um pouco de sua biografia. Segundo nos conta, desde a infância fora influenciado por seu pai - um maçom que ostentava orgulhosamente diversos títulos  - a estar próximo da Fraternidade. Por ser jovem demais para os processos de admissão, fora primeiramente encaminhado para a Ordem Demolay, local onde iniciaria e desenvolveria seu fascínio por todo este contexto. Portanto, é preciso que se entenda que este livro, apesar de não ser um título oficial da Ordem, é escrito por um alguém que pertence a ela.

Sendo assim, é importante que o leitor iniciante tenha em mente que muitas das histórias contadas sobre o que seja a Maçonaria e o que fazem seus membros, quando ditas por pessoas que não pertencem a ela, podem não estar em par com a realidade. Por um outro lado, se você busca um livro introdutório sobre o tema e que, de forma imparcial lhe dará uma visão sensata sobre o contexto maçônico, sem fantasias ou proselitismo, talvez este seja o título que você busque. Isto porque à continuidade de seus capítulos, Lon nos fala sobre as origens históricas da Maçonaria, ou seja, aquelas que de fato podem ser comprovadas através de documentos, e sobre aqueles aspectos tradicionais, que podem não ter qualquer relação com a realidade.

Sim, muitas são as sociedades secretas que se apoiam em mitologias religiosas para fundamentarem seus ritos, e a Maçonaria não foge a esta regra. Segundo o autor, as diversas referências e representações ritualísticas, que de uma forma geral ilustram histórias bíblicas, são uma mostra de que o espírito religioso - mais contemplativo - em oposição ao espírito esotérico - mais investigativo - ainda preenche e dita o comportamento da maioria dos homens de avental. A argumentação de DuQuette reside portanto sobre dois pontos: primeiro, que os maçons tem demonstrado pouco interesse na investigação científica e as verdadeiras origens de suas cerimônias, e que com isso, naturalmente, podem desconhecer muito do sentido de seus próprios ensinamentos; e segundo, que talvez muitos de seus segredos recaiam, mesmo que de forma subliminar, sobre os recônditos misteriosos da magia.

Para explorar e aprofundar suas especulações, Lon conduz o leitor a uma série de questionamentos com base em elementos bíblicos e históricos. De acordo com ele, a Maçonaria apoia sua divisão de graus sobre o mito de Salomão, filho do rei Davi, e a construção de seu suntuoso templo. Faz comparativos com os relatos destas histórias contidas no Antigo Testamento e n'As Mil e Uma Noites, destacando o quanto Salomão é, neste caso,  retratado como um poderoso mago que lançara mão de sortilégios e espíritos diversos para erigir seu santuário, em oposição aquele Salomão descrito na Bíblia, retratado de forma mais modesta em seus feitos. Mas deixa claro que estas histórias são pura mitologia, uma vez que não hajam provas arqueológicas de nenhum dos elementos citados.

Saltando para um cotexto mais recente, destaca a existência dos Templários,  seu fascínio por sua história e possíveis lendas atribuídas a eles. E também alega que, apesar das diversas especulações, não existem fatos reais que liguem a Maçonaria com a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo.

DuQuette é ousado e sua bagunça argumentativa sugere, dentre outras coisas, que: se muitos dos personagens contidos na Bíblia forem fruto da invencionice e criatividade humana, e ainda que, se a Ordem Templária fora criada para encontrar um suposto tesouro de um Templo de Salomão que nunca existiu, tudo então não passaria de uma grande mentira mantida em silêncio para evitar um cataclisma no mundo medieval. Sendo assim, talvez os conflitos existentes entre os Cavaleiros do Templo e a Igreja Católica, sejam fruto da necessidade do encobrimento desta verdade;  a posse deste segredo faria com que os Templários fossem uma ameaça para a Igreja, pondo-a em risco de perder sua credibilidade histórica, não deixando alternativa se não a de ter de destruí-los completamente. 

Nesta primeira parte do livro, seu autor faz com que seus capítulos oscilem entre os tempos modernos e o passado, comparando comportamentos e ideias que se tem hoje, com prováveis ou improváveis elementos que se tinham em outras eras, fazendo com que o leitor use de seu senso crítico, mais do que a crença, para acompanhá-lo nesta viajem.

Em sua segunda parte, chamada A Magia de Salomão, trata exclusivamente de Goétia e diz que apesar da aparente incongruência desta seção para com aquela que a antecede, espera que o legente entenda as razões para tratar deste assunto aqui, ou terá falhado em seus objetivos de 'despertar o Salomão arquetípico na mente do leitor.'.

Lon é por vezes subjetivo e parece querer que aquele que o lê chegue as suas próprias conclusões baseados em suas sugestões. Ao que nos parece, a condução de toda a primeira parte serve para dizer que apesar dos mistérios e das lendas envolvendo grande parte destes elementos históricos, a influência mental que eles ativam na psique dos envolvidos é forte o suficiente para causar transformações. Ora, se a religião e o mito tem o poder de mover pessoas, Ordens e nações através de suas sugestões psicológicas, o que dizer da mágicka? Sendo assim, não há que se duvidar da eficácia da magia e portanto, por que não fazer uso dela?

Baseado nesta ideia, elenca sete perguntas que um alguém cético, ou ainda que nunca tivera envolvimento com a magia cerimonial, poderia fazer. Faz-se importante frisar aqui que DuQuette preocupa-se em dar explicações psicologistas, e não tradicionais, que poderiam ser toscamente resumidas por: faça, se der certo, maravilha, se não, você não tem nada a perder! Por fim, traz todos os elementos necessários para a prática da Goetia e sua lista de 72 demônios com seus selos e descrições.

Este é um livro básico, que oscila entre especulações sobre  Templários, segredos, magia, filosofia, história e o discurso maçônico, atrelados as lendas, crenças religiosas e populares. Seu amarrado é um tanto confuso e muitas das promessas de revelações de segredos feitas, são respondidas com o clássico 'é preciso ter olhos para ver.'.

É especialmente voltado para aqueles que já saíram do jardim de infância das teorias conspiracionistas mas que ainda não chegaram as escadarias acadêmicas. De qualquer forma, vale a leitura.

por Allan Trindade

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sexta-feira, 15 de setembro de 2017


Quando as primeiras notícias foram publicadas sobre o "menino" do Acre, algumas pessoas pediram que eu fizesse um vídeo analisando o caso, que até então, resumia-se apenas a uma filmagem com uma escultura de Giordano Bruno em seu quarto e alguns círculos pertencentes a um desenho animado, erroneamente associados aos nossos simbolismos ocultos. 

Expliquei-lhes que este blog destina-se a análises literárias, mas que em havendo a promessa de que os livros escritos por Bruno Borges seriam lançados, ao menos o primeiro deles receberia nossos comentários.

Então que fique claro que só há um motivo para este título estar aqui: o cumprimento da nossa palavra para com aqueles que acompanham nosso trabalho.

TAC - TEORIA DA ABSORÇÃO DO CONHECIMENTO é um livro escrito por Bruno Borges, publicado no ano de 2017 pela editora Arte e Vida, com 191 páginas, divididas em 8 capítulos.

Pensamos ser necessário, antes de mais nada, dar uma explicação sobre a introdução desta resenha e o porquê da nossa ênfase de que não fosse pelo motivo apresentado, este título não estaria aqui. Tudo isto se dá por uma razão deveras simples: este não é um livro religioso, esotérico, nem tampouco, ocultista. Toda a aura criada em seu entorno, e até mesmo a criptografia usada para codificar o seu conteúdo, que aparentemente levara os mais incautos a conclusão de que esta obra continha algo de místico e secreto, parecem muito mais fazer parte de um plano de maquiagem que traveste uma ideia simples, na tentativa de torná-la bela e atraente, que efetivamente necessária para uma verdade transformadora e revolucionária. Já que isso, diga-se de passagem, é o que menos encontramos aqui.

Borges inicia seus argumentos sobre a premissa de que os seres humanos são basicamente comuns uns aos outros, mas que nos diferenciamos verticalmente dos outros animais por nossas capacidades de comunicação e absorção do conhecimento. Entretanto, para sermos efetivamente singulares como seres pensantes, para nos diferenciarmos uns dos outros e do coletivo de homens e mulheres que vivem apenas para reproduzir e sobreviver,  precisamos investir constantemente na absorção do conhecimento. Se nos fosse pedido um resumo para o livro, consideramos que este parágrafo seria mais que suficiente para explicá-lo. 

Seu título, Teoria da Absorção do Conhecimento, doravante TAC, nos dá o vislumbre sobre o único ponto a qual o livro se apoia: quanto mais conhecimento absorver, mais conhecimento terá. Sim, esta impressão lógica que se tem logo ao ler suas primeiras páginas é a exata sensação de que é lógico que isto irá ocorrer a qualquer um que acumular conhecimento. Dito de uma outra maneira, nos parece bastante óbvio para todos que se uma pessoa se dedica a uma determinada área do conhecimento, ou a várias delas, e investe constantemente no acúmulo de informações, esta pessoa terminará com mais conhecimento acumulado que a maioria, e naturalmente se destacará dentre a massa. E é necessário um livro inteiro para dizer isso?

Mas a principal pergunta que nos fazemos é: será que Bruno Borges acha que isso não é óbvio para todo mundo? Será que considera que esta conclusão é de fato revolucionária e que o apontamento desta obviedade fará com que as pessoas passem a devorar livros e buscar o conhecimento ininterruptamente? Ou será que as pessoas tem, mesmo que de forma subjetiva, a exata noção disso, mas que consideram que no sistema sócio-político a qual vivemos, existem outras maneiras de se destacar que não necessariamente a intelectual, como através de habilidades físicas dos desportistas, por exemplo, e que portanto, o acúmulo de conhecimento não seja a única possibilidade para o sucesso?

Tudo bem, vamos considerar que o autor da TAC tenha noção destas outras possibilidades, mas que queira focar sua observação e método apenas sobre este ponto. Consideremos que sua premissa tenha um viés evolutivo, baseado na ideia de que quanto mais sábios formos, melhor seremos. Portanto, voltemos a linha de raciocínio. Segundo sua perspectiva, um indivíduo com um determinado quantitativo de conhecimento prévio, somado a um número de conhecimento posterior, culminará num resultado de conhecimento maior para ele próprio e, posteriormente, para o coletivo. Em outras palavras e para ilustrar melhor a questão, digamos que se hipoteticamente você tem 10% de conhecimento acumulado, somados a mais 20% de conhecimento adquirido, resultará em 30% de conhecimento total. Sendo assim, se a massa de seres humanos tem uma média de 15% de conhecimento permanente, ao acumular e manter o processo constante de absorção de conhecimento, você se destacará e distanciará cada vez mais de todos os outros, ad infinitum. Seria então este o motivo para aqueles indivíduos considerados gênios terem comportamentos por vezes excêntricos, e serem comumente taxados de loucos, pois o resto da humanidade não alcançaria intelectualmente o nível da sua genialidade e de suas percepções de mundo.

Pois bem, até aqui pensamos que a ideia central fora plenamente exposta. Mas o livro traz mais gráficos, proporções e porcentagens, desta vez para explicar como impulsionar a sua absorção de conhecimento. Uma vez entendido que é através do acúmulo de conhecimento constante que o ser humano pode se destacar dentre os outros, Bruno cita uma sequência de elementos que podem ajudá-lo, ou prejudicá-lo, de acordo com suas escolhas, nessa empreitada. Segundo ele, um indivíduo que sublime sua sexualidade, a ponto de não relacionar-se sexualmente, reproduzir ou constituir família, terá mais sucesso em sua teoria. O mesmo para aqueles que sejam vegetarianos e tenham um sono polifásico. Nesta junção, um indivíduo que não pratique sexo e não constitua família, não coma carne e durma pouco, terá muito mais chances percentuais na TAC que um outro que não atente para estes pontos. 

Neste conjunto cita uma série de personalidades, que de acordo com suas conclusões, seguiam de forma total ou parcial este planejamento, tais como: Leonardo da Vinci, Platão, Isaac Newton, Jesus Cristo, Albert Einstein, Heráclito de Éfeso, Michelangelo, Hitler ...dentre outros, incluindo nesta lista até mesmo Michael Jackson, referido pelo autor como um sábio assexuado. Portanto, para Bruno Borges, gênios não nascem gênios, mas se fazem assim.

O livro é repetitivo, cheio de erros de revisão, não se baseia em nenhuma ideia religiosa, esotérica ou ocultista, salvo a citação de algumas personalidades e sociedades secretas de maneira muito superficial, apenas como exemplos, e não traz nada de realmente surpreendente: é apenas uma organização teórica para uma conclusão comum e lógica; quanto mais você estudar, mais conhecimento vai ter, com isso vai se destacar intelectualmente dentre a maioria e ampliará sua capacidade de criar. Não temos dúvidas, suas 191 páginas poderiam ter sido reduzidas a 1/4 deste total, e isso não lhe faria a menor diferença.


Seu contexto? Sensacionalista.
Seu autor? Pretensioso.
Seu conteúdo? Dispensável.

por Allan Trindade



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segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Em meados do século XX, um músico e  ex artista circense daria início a uma nova religião após o lançamento de um livro que atrairia a simpatia de muitos, e a antipatia de tantos outros. Seu autor? Anton Lavey. Seu título? A Bíblia Satânica. Genial, devemos por princípio considerar. Isso porque seu nome reúne em si duas palavras de impacto tão forte sobre o imaginário e religiosidade popular, que sua simples menção causa desconforto na maior parte da população, e tem um poder intrínseco de atrair a atenção e curiosidade de todos, sejam eles crentes ou ateus. 


E quanto a isso não há com que se estranhar. Pois para a maioria das pessoas, o vocábulo bíblia não é um simples substantivo, usado para definir qualquer conjunto de livros reunidos num único tomo. Mas tem uma relevância espiritual, consideram-no sagrado, e por isso mesmo, usam o termo de forma quase sempre generalista para se referirem aquela bíblia específica, a dos cristãos, a Bíblia Sagrada. E se para muitos a palavra bíblia é sagrada por si, quão herético seria vê-la junto da palavra satânica?

Satã, o rival, opositor, o inimigo daquele 'Deus Sem Nome' dos judeus que também transforma um substantivo comum em nome próprio. Apontado como fonte de todo mal, personificado por uns como tendo a forma de um bode - por vezes um tanto quanto indecente -, e por outros tantos como sendo um anjo andrógeno de feições virginais. Sentenciado como indutor de estupros de crianças até batidas acidentais com o dedo mínimo do pé na quina do sofá. 


Se injustiçado ou justamente condenado, não sabemos. Mas nos parece digno que  após tantos anos de acusações, e a falta de consenso sobre quem, ou o quê, ele seja, que um de seus representantes tenha se erguido para finalmente falar em seu nome.

A BÍBLIA SATÂNICA é um livro escrito por Anton Szandor LaVey, publicado no ano de 2010 pela editora Saída de Emergência, com 191 páginas, divididas em 4 livros internos.

Esta é uma edição portuguesa, e portanto, algumas das palavras e expressões usadas podem causar certa estranheza aos leitores brasileiros. Não apenas pelas diferenças ortográficas que compartilhamos mas também pelo uso e escolha dos tradutores sobre alguns termos específicos, geralmente traduzidos por nós de forma literal do inglês, e não interpretados, como assim o fizeram. Para exemplificar; Left Hand Path, costumeiramente transposto em terras tupinikins como Caminho da Mão Esquerda, fora definido como Via Antinomiana por nossos irmãos lusitanos; Lesser Magic (Baixa Magia) como Magia Mundana; Black Magic (Magia Negra) como Caminho Relativo, além de outros, todos devidamente explicados num glossário nas páginas 190 e 191 desta edição.

Ainda dentro do contexto além mar, em sua introdução, Lurker nos fala sobre sua experiência e encontro junto ao caminho satânico, o entendimento do povo português sobre o assunto, e a criação da Associação Portuguesa de Satanismo, fundada com o objetivo de divulgar e esclarecer a verdade sobre esta nova religião. Em seguida, Peter Gilmore nos conta sobre sua entrada na Church of Satan, traz uma pequena biografia de seu fundador, além de citar filmes, documentários e os livros que vieram em seguida a este, celebridades que passaram pela igreja e as razões para ter se tornado seu sumo sacerdote. Estas introduções, explicativas e bem desenvolvidas, contribuem muito positivamente para o entendimento de todo este contexto.

O prefácio assinado pela Church of Satan fala como que em forma de manifesto sobre quais são os objetivos deste livro: ser uma resposta aos grimórios, tratados e documentos antigos de magia que, segundo eles, com raras exceções, "...não passam de divagações santimoniais fraudulentas - devaneios dominados pela culpa, e de uma algaraviada esotérica levados a cabo por cronistas do saber mágico, incapazes ou relutantes em apresentar uma perspectiva objectiva sobre o assunto. " pg.34. No prólogo, expõe sua visão sobre os deuses da Via Nomiana (Mão Direita) e de suas brigas para perpetuarem suas mentiras e de seus sacerdotes. Saúda Satã e a carne, alegando que sua era finalmente chegara, e que uma grande igreja será erguida e consagrada em seu nome. Tudo isso de uma maneira um tanto poética, porém, sem muita elegância. 

Por fim das introduções nos traz uma lista chamada "As Nove Declarações Satânicas", com uma sequência explicativa sobre aquilo que Satã representa; ideias, sentimentos, ações e reações. Nada de descrições sobre uma figura personificada com chifres ou qualquer outra forma por aqui. E é a partir deste ponto que o livro se subdivide em quatro, o que justifica seu título de bíblia, cada qual associado a um ser demonizado, a saber: O livro de Satã, O livro de Lúcifer, O livro de Belial e O livro de Leviathan.

No Livro de Satã, relacionado ao elemento Fogo, LaVey esclarece que os difamadores deste ser sempre tiveram voz, foram ouvidos, pregaram a caridade, mas nunca deram a chance para o representante do mal se defender de seus ataques. O que - segundo o autor - é uma atitude ingrata, uma vez que não fosse por Satã, suas igrejas não teriam o sucesso que tem, afinal de contas para dizer-se bom é preciso definir e apontar quem é mal. O livro não nos fornece informações sobre como estas quatro divisões foram escritas, se por inspiração diabólica, conclusões racionais ou incorporação de algum ser espiritual. Entretanto, aqui LaVey mais uma vez encarna uma fala poética e assume a voz do próprio Satã. É inteiramente escrito em versículos, divididos em cinco capítulos, com parte de seu discurso voltado contra o contexto judaico-cristão. Fala sobre diretrizes ideológicas, atitudes esperadas para um satanista, mas acima de tudo: exalta o forte e despreza o fraco.

#8 Eu levanto bem alto o estandarte dos fortes! pg.44

#1 "Amai-vos uns aos outros" foi dito ser a lei suprema, mas que poder é que a tornou assim? Sobre que autoridade racional assenta o evangelho do amor? Por que razão não deverei eu odiar os meus inimigos - se os "amar", isso não irá me colocar à sua mercê? pg.46

#7 Odeia os teus inimigos com todo o coração e, se um homem te bater numa face, ESMAGA-O na outra! Liquida-o sem piedade, pois a auto-preservação é a lei mais elevada! pg.47


No Livro de Lúcifer, associado ao elemento Ar, abandona a forma de versículos - e assim o faz com todos os livros sequentes - e traz interessantes reflexões sobre a liberdade, alegando ser esta fruto da dúvida e não da verdade. Neste ponto é preciso que se tenha compreendido que a base argumentativa do autor é que a verdade não está engessada no tempo ou no espaço, é dinâmica e relativa, e portanto, uma religião, ou um livro,  que se pretenda ser a resposta ultimal e atemporal para todas as questões humanas, só pode ser falso. Sendo assim, se o Diabo é o pai da mentira, só pode ser ele o autor da Bíblia Sagrada. 

Neste livro, de natureza mais filosófica e questionadora, o autor nos fala sobre a inutilidade de rezas, sobre a hipocrisia do ódio disfarçado de amor praticado por muitos indivíduos que se escondem através de certas crenças, afirma que satanistas acreditam em Deus ao mesmo tempo que alega que as religiões, e seus deuses, são invenções humanas, e portanto, melhor fariam as pessoas se investissem seu tempo e energia em lutar pelos seus quereres, ao invés de implorar por eles. 

Aqui ainda confronta especificamente uma série de crenças e práticas cristãs, aponta a dissimulação de algumas religiões neo-pagãs, de tradição no caminho bruxaria, que apesar do discurso de emancipadas, mantém a crença de que seus feitiços não podem ser praticados por vontade pura e simples do feiticeiro, acreditando estarem subordinados a uma lei de tríplice retorno que por fim os tornam nada menos que cristãos compassivos disfarçados, e portanto, segundo ele, menos respeitáveis que os verdadeiros cristãos.

Lúcifer é certamente o mais significativo de todos os livros, não apenas pela maior substância de páginas, mas também por sua variedade de elementos contidos. Aqui se encontram muitas das explicações sobre o que é ser satanista, o por que do uso do termo e a diferença de suas ideias para ideias previamente existentes, das razões para o Satanismo ser uma religião, sobre a etimologia dos deuses e sua demonização pelos cristãos, lista uma série de demônios, fala sobre pactos, amor , temor, sexo, fetichismo, sadismo, masturbação, vampiros, prazer, sangue, sacrifícios, missas negras,  dentre outros. Se tivéssemos que dar uma referência direta para sanar suas dúvidas sobre o que é e o que pensa o Satanismo, seria este o livro a ser primeiramente lido.

O Livro de Belial, relacionado ao elemento Terra, é destinado as explicações sobre qual é o entendimento da magia dentro da doutrina satânica. Considerada neutra e isenta de qualquer conceito moral ou ético, é dividida em duas classes: magia ritual/cerimonial ou não ritual/manipulativa. Aqui, Anton reside suas ideias sobre a base de que a magia ocorre graças a manipulação e direcionamento de energias induzidas - ou auto induzidas - e direcionadas com o fim de causar determinados efeitos que de outro modo não ocorreriam. Sendo assim, magia é: " A alteração de situações ou acontecimentos de acordo com a vontade do indivíduo, os quais, usando-se de métodos normalmente aceites, seriam inalteráveis." pg.127

Veja que o conceito é comum e familiar para todos aqueles minimamente estudados nas ciências esotéricas. Para além disso e de forma mais específica, aparentemente, a premissa de seu trabalho mágico é sempre individual, mesmo quando feita em grupo, e a energia do indivíduo é acreditada como sendo a única responsável pela produção de todos os efeitos conquistados. Mas ainda sim, você encontrará evocações e listas de entidades demoníacas em várias partes do livro. 

Note que aqui usamos o termo "aparentemente" pois este não é o único livro escrito por este autor para explicar sua doutrina. Além disso, as práticas de sua igreja, ou até mesmo de seus adeptos, podem diferir das ideias que apresentamos através desta leitura. Portanto, que fique claro que as conclusões que assumimos aqui, são baseadas única e exclusivamente sobre as impressões que tivemos apenas ao ler esta obra em específico. 

Além das classes apresentadas acima, LaVey nos fala sobre os três tipos de ritual na magia satânica: O Ritual Sexual; O Ritual da Compaixão e O Ritual da Maldição. Seus ingredientes, onde cita uma séria de posturas mentais e condições temporais ideais para a realização destes ritos; uma sequência preparativa base para o cumprimento dos rituais, onde cita todo o passo a passo a ser produzido; além dos itens e paramentos para o rito, tais como: mantos, altar, o selo de Baphomet, velas, sino, cálice, elixir, espada, pênis, gongo e pergaminho. 

Por fim, chegamos ao Livro de Leviatã, associado ao elemento Água e que nos explana a importância da ênfase na fala durante o ritual, traz uma invocação a Satã e uma invocação para cada um dos três tipos de rituais satânicos. Conclui todo seu conjunto com as Chaves Enoquianas, expõe seu uso dentro do Satanismo e ressalta o poder contido nesta língua.

Este é um livro religioso, e tal qual a maioria deles, possui um discurso de natureza dúbia e em muitos momentos, contraditória. A argumentação de LaVey durante grande parte de sua fala leva o leitor a acreditar que a essência do Satanismo é ateística; que nega a existência de seres espirituais e até mesmo poderes ocultos passíveis de serem controlados e direcionados por seres humanos. Mas seu fim certamente não é este. Os últimos capítulos de sua bíblia apresentam uma série de conceitos e rituais que nos fazem questionar grande parte das afirmações enfatizadas em seu princípio.

Anton, aparentemente um ateu que acredita nos poderes invisíveis e projetáveis da mente humana, destila uma significativa parte de sua revolta contra as religiões judaico-cristãs, mas certamente peca ao cometer um erro corriqueiro, característico de pessoas que se deixarem levar pelo abalo de experiências traumáticas: o generalismo. Seu discurso é comum a muitos ateus: a frustração que o Cristianismo lhes causara, em muitos casos, faz com que se revoltem contra todas as religiões. 

Em muitos momentos de sua fala, ao se referir a outras formas de crença, ignora qualquer premissa metafísica e filosófica que elas apresentem, demonstrando uma certa incapacidade - ou falta de boa vontade - em considerar que sua verdade talvez não seja tão absoluta assim, julgando os outros como supersticiosos ou escravos de suas próprias ilusões. Aponta o dedo para aqueles de outras religiões que rezam pelos seus doentes, por exemplo, dizendo que esta é uma atitude inútil, mas traz instruções para um Ritual de Compaixão satânica, objetivando o mesmo fim. 

É certamente proselitista e ingênuo, ignorante ou talvez seja mesmo falso, ao dizer que o Satanismo é a única religião que permite e encoraja a liberdade sexual com honestidade, ignorando religiões pagãs, ou mesmo neo pagãs como Thelema, detratando Crowley, alegando que seus escritos fazem sentido apenas para thelemitas, porém esquecendo-se - convenientemente - que Thelema antecede em muitas décadas a criação de sua religião satânica, e que traz em si muitas das ideias vendidas por ele como sendo suas.

O Satanismo de LaVey é uma exaltação a carne e a materialidade. Prega a satisfação dos prazeres e a não preocupação com julgamentos divinos ou pós vida. Baseia-se na ideia de ação e reação, tanto a nível físico, quanto a nível psíquico, além de pregar a liberdade absoluta de todo ser humano. É essencialmente anti-cristão e fundamenta grande parte de sua ideologia contra a teologia e aos ditos seguidores de Jesus. É por vezes ateu, por outras é teísta, e em outras ainda deísta: encontramos certa dificuldade na hora de definir se de fato esta é uma religião que nega a existência espiritual de deuses - uma vez que tenha sido dito que eles são criações humanas - ou se apesar da crença de que estes deuses/demônios sejam criações humanas, eles existam em algum nível metafísico, e não apenas mental. Sua lógica é bastante confusa e dispersa, deixando o leitor sem ter certeza sobre no que, afinal de contas, o Satanismo acredita em termos espirituais. Em função de muitos destes elementos não podemos negar nossa decepção.

Para todos os ocultistas: o título traz uma série de questionamentos e apontamentos bastante pertinentes ainda nos dias de hoje. É um livro clássico, obrigatório, porém religioso, sendo assim, com as devidas ressalvas, recomendamos a leitura.

Para Satã: torcemos para que da próxima vez encontre um representante que escreva uma bíblia que não tenha a mesma característica da bíblia dos cristãos: a contradição.

Para o senhor Anton LaVey, pedimos desculpas pela sinceridade mas achamos importante lhe dizer: existem mais mistérios entre o Céu e o Inferno que supõe sua vã satania!


por Allan Trindade