sábado, 13 de junho de 2020

Em um tempo onde pessoas clamam pelo retorno de sistemas 
políticos e ideológicos dignos das mentes
mais atrasadas e boçais, nunca se fez tão necessário o estudo da história. Divulgar elementos do nosso passado enquanto sociedade e seres que tendem a repetir biológica e ideologicamente ações herdadas de nossos genitores, torna-se elemento fundamental  para tentar  evitar que aqueles mais suscetíveis aos discursos inflamados dos fanáticos e idólatras, não sejam infectados por suas falácias de "nos dias de hoje" ou "na minha época não era assim", induzindo-os a falsa ideia de que somos, enquanto seres humanos, absolutamente diferentes de nossos antepassados. 

Não há dúvidas, as coisas mudam. Porém, mudanças tecnológicas tendem a ser muito mais rápidas e eficientes que mudanças fisiológicas. Se podemos dizer que nos últimos 100 anos a humanidade alcançou avanços científicos nunca antes vistos em nossa história, biologicamente mudamos pouco ou quase nada em relação a nossos ancestrais de 4.000 anos atrás. 

Se podemos afirmar que o apaixonado grego ao trovar seus versos expunha e imortalizava seu amor através de suas palavras, atravessando as barreiras do tempo e encontrando correspondência no coração dos amantes dos dias de hoje, o mesmo pode se dizer daquelas também palavras milenares que propagavam o ódio contra o diferente, continuamente sendo reproduzidas através da boca de alguns cristãos, ideólogos políticos e relacionados até a presente data. 

Tal como o amor, o ódio não é uma exclusividade dos nossos tempos. Mas o despertar de flagrantes manifestações de burrice e ignorância frente a facilidade de acesso ao conhecimento tal como nunca antes vista, parece ser mesmo um fenômeno inédito e característico desta era.

Se antes poderíamos dizer que as pessoas tomavam determinadas atitudes por serem analfabetas ou não terem acesso ao conhecimento, qual será a desculpa para, nos dias de hoje, ainda existirem indivíduos que pensam e agem como neandertais, sedentos por discriminar, agredir ou matar o outro apenas por ser diferente?

LIBER QUEER é um livro escrito pelos membros do Círculo da Viada Chama Púrpura, com 213 páginas divididas em 24 capítulos e foi publicado no ano de 2019 de maneira independente.

Acredite, a homossexualidade sempre existiu em meio a humanidade. É um fenômeno tão comum quanto qualquer outro, encontrado inclusive em meio ao comportamento de animais não humanos. Você provavelmente já deve ter visto dois cachorros machos tentando fazer sexo entre si. Ou mesmo duas cadelas. Assim como os golfinhos que em sua adolescência ensaiam o sexo antes de reproduzirem com as fêmeas. Ter consciência disto não implica que você precisa fazer o mesmo. Nem tampouco que você tem o direito de impedir o outro. É simples, não?

Nada incomum. Nada anormal. Tudo devidamente evidenciado pela ciência e registrado  na história. E se por um lado temos algumas religiões que tentaram e tentam criminalizar tal comportamento, toda uma série de outros sistemas místicos sempre trataram tal fenômeno tal como ele é: uma parte intrínseca da existência humana. E para apontar tais fatos que o Círculo da Viada Chama Púrpura reuniu uma série de indivíduos LGBTQI+, para falar não apenas como membros desta comunidade, mas como graduados academicamente, e portanto, qualificados cientificamente para participarem da produção desta obra.

O objetivo aqui pode ser dividido em três aspectos:

Primeiramente objetiva apropriar-se do termo e ideal queer, traduzir e correspondê-lo a palavra que mais se aproxime do mesmo sentido em seu original. Queer em inglês representa tudo aquilo que é excêntrico, marginal, exótico, bizarro e sexualmente reprovável. Perceba que aqui dizemos que não se trata de ser excêntrico OU marginal, exótico OU bizarro, mas tudo isso amalgamado num só conceito. Isto é o queer. Refletindo sobre qual palavra em nossa língua mais se aproximaria daquela, concluíram então que 'viado' seria o mais adequada para tal, visto que tal como seus co-semelhantes estrangeiros, a apropriação do xingamento representa também uma atitude política de empoderamento frente ao constante processo de naturalização da discriminação e assassinato de homossexuais e relacionados. Tal atitude poderia ser traduzida como: " Sou viado mesmo, e daí?! ";

Em segundo lugar o livro visa elencar os elementos históricos que apresentam indivíduos LGBTQI+ sob as mais diferentes funções religiosas e correlações divinas, apresentando uma série de estudos onde tais pessoas eram não apenas conhecidas e aceitas dentro das sociedades antigas, como também e em muitos casos, adoradas como divindades encarnadas vide sua excentricidade frente a dicotomia do gênero estabelecido, a saber homem e mulher, transcendendo tal dualidade. Ou mesmo no campo da sexualidade onde homens poderiam ser adorados por outros homens com intenções místicas e sexuais, de tal modo que cidades e religiões inteiras foram criadas para este propósito. Aqui tratam ainda daqueles seres espirituais, deuses e deusas que foram capazes de mudar suas formas e sexualidade apenas pela possibilidade de contato com outros seres divinos ou mesmo seres humanos;

Como um terceiro e último elemento, a edição nos apresenta uma série de rituais, listas de correspondências, instruções para altares e até mesmo sigilos e pantáculos voltados para o fortalecimento e proteção do público LGBTQI+.

Liber Queer pode ser visto como uma espécie de manifesto. Tal publicação não tem uma intenção puramente literária, mas social e política. Tal como o queer, agrega tudo, discrimina nada. Visa preencher a lacuna sentida por muitos membros de tal comunidade que nunca puderem se ver representados nas modernas publicações religiosas ou ocultistas, sendo também e sempre relegados ao campo da indiferença, negação ou rejeição. Aqui, gays, lésbicas, bissexuais, transsexuais e todo o conjunto de indivíduos pertencentes a este universo contribuem, cada um a sua maneira, com um pouco de sua vivência e sugestão para que todos possam encontrar também na magia um pouco de amor e muito mais de paz.

" tomai vossa fartura e vontade de amor como quiserdes, quando, onde e com quem quiserdes!" - AL I:51

por Allan Trindade


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